A Conveniência versus Justiça: Reflexões sobre a Discrepância entre Direito e Decisões Judiciais
Por Carlos Galdino
A justiça é um ideal que permeia os sistemas legais ao redor do mundo, buscando assegurar a equidade e a aplicação imparcial das leis. No entanto, a realidade dos tribunais muitas vezes revela uma dinâmica distinta: nem sempre quem está certo ou possui a razão mais sólida sai vitorioso. Em vez disso, o que frequentemente prevalece é o que é mais conveniente para uma das partes envolvidas.
A dicotomia entre direito e justiça se torna evidente em situações onde as decisões judiciais parecem distantes dos princípios éticos e morais que sustentam o senso comum de justiça. Enquanto o direito é fundamentado em normas e procedimentos legalmente estabelecidos, a justiça transcende essas formalidades, incorporando uma dimensão moral que visa a equidade e o bem comum.
A teoria jurídica oferece uma perspectiva profunda sobre essa dissonância. Segundo Jorge Miranda, renomado jurista português, "o direito busca a aplicação técnica das normas, enquanto a justiça aspira à correção e à equidade nas relações humanas" (Miranda, 2010, p. 87). Essa distinção essencial entre aplicação técnica e ideal de justiça ressoa na prática judiciária, onde decisões muitas vezes refletem mais a estratégia processual e a conveniência das partes do que uma busca pela verdadeira justiça.
Além disso, o filósofo do direito Ronald Dworkin argumenta que "a justiça não pode ser reduzida a um conjunto de regras fixas e universais; ela envolve a interpretação e a aplicação sensível das normas em contextos específicos" (Dworkin, 2008, p. 112). Essa interpretação sensível é crucial para compreender por que, em certos casos, a decisão judicial pode parecer desalinhada com o que seria esperado à luz de um ideal de justiça mais elevado.
Na prática forense, o fenômeno onde "vence quem faz o gol, não quem joga certo" pode ser ilustrado por casos emblemáticos onde o poder econômico, a influência política ou simplesmente a estratégia jurídica superior determinam o resultado de um litígio. Isso levanta questões éticas profundas sobre a equidade do processo judicial e a eficácia das instituições jurídicas em garantir a justiça para todos os cidadãos.
Portanto, é essencial reconhecer que a justiça, embora seja o ideal almejado, nem sempre é alcançada devido às complexidades e imperfeições do sistema legal. Enquanto o direito busca a consistência e a aplicação uniforme das normas, a justiça frequentemente exige uma análise mais profunda das circunstâncias individuais e um compromisso com a equidade.
Em síntese, a dissonância entre direito e justiça é um tema de reflexão contínua no campo jurídico e filosófico. Explorar essa dinâmica não apenas ajuda a compreender melhor as decisões judiciais, mas também propicia um diálogo crítico sobre como melhorar os sistemas legais para que possam verdadeiramente refletir os ideais de justiça que sustentam nossas sociedades.
Referências Bibliográficas:
- Dworkin, Ronald. Justice for Hedgehogs. Harvard University Press, 2011.
- Miranda, Jorge. Manual de Direito Constitucional: Estrutura Constitucional do Estado. Coimbra Editora, 2010.
Carlos Galdino
Bacharel em Direito pela Faculdade IX de Julho -SP
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